quarta-feira, 16 de março de 2011

Será que somos livres? - Parte 1


          Muitos dos meus amigos e irmãos da minha própria igreja se surpreendem comigo quando afirmo que não acredito no livre-arbítrio. Um dia viajando para São Vicente, um amigo disse, espantando, que não acreditava nisso. E a nossa conversa durou a viagem toda. Uma semana depois o tio desse amigo – que também não acredita no livre-arbítrio – o questionou sobre isso e voltamos a conversar sobre o assunto.

         Um amigo da igreja me escreveu na semana passada que não tinha entendido muito bem a argumentação sobre o meu texto sobre a bondade de Deus nos conduzir ao arrependimento. O Leo captou a ideia do texto e não entendeu errado não. Naquele texto assumo uma postura teológica conhecida como calvinismo e é isso que muita gente não compreende. Então resolvi escrever um pouco sobre esse assunto que divide opiniões na Igreja desde há muito tempo.

         Em primeiro lugar precisamos entender que nossas escolhas não são completamente livres. Estamos sendo influenciados por todos os lados e somos forçados a fazer escolhas de acordo com essas influências. Por exemplo, o casamento. Quem escolhe livremente seu cônjuge? Da minha parte, o amor, o carinho, a inteligência, os pontos de vista, a maneira de encarar a vida, a beleza da Cyntia me fizeram escolhê-la como minha esposa. Por que eu não fui capaz de escolher casar com nenhuma outra namorada? Havia algo na Cyntia que me prendia a ela de tal maneira que não tinha outro jeito a não ser me casar com ela. Ora, essa minha escolha de me casar com a Cyntia foi livre?

         Em segundo lugar, surge a necessidade de entender o que significa a palavra livre. Se você procurar uma definição para essa palavra, vai encontrar no dicionário o seguinte: que é senhor de si e de suas ações; dotado do poder de escolha, que não está sob o jugo de outrem. Ora, não somos senhores de nós mesmos e temos vários jugos sobre nós: a sociedade, a família, o trabalho, a igreja. Além disso, o Estado legisla sobre a nossa liberdade. Veja o que o dicionário ainda diz sobre uma pessoa livre: capaz de exercer seus direitos civis e políticos dentro dos limites que lhe faculta o Estado, a lei. Nossa liberdade tem limites.

         Imagine agora uma escolha das mais simples na nossa vida, uma roupa. Pense na camisa ou camiseta que você está vestindo agora. Independente da cor que ela tenha, por que você escolher exatamente essa cor? Talvez porque no ambiente de trabalho não combine outra. Talvez porque essa cor combinava com a calça que você está vestindo. Talvez porque a camiseta tenha uma estampa legal e colorida que você gosta. Talvez a estampa da camiseta mostre uma mensagem que você quer transmitir às pessoas. Talvez ainda porque você ganhou essa camiseta de uma pessoa que você gosta muito. Ou ainda porque você tinha dinheiro suficiente para comprá-la. Perceba que existem inúmeros fatores que te conduziram a ter e a usar essa camiseta. Você realmente se sentiu livre quando optou por ela. Mas o fato nos sentirmos livres garante, efetivamente, que somos livres? Pense nisso!

         Eu não escolhi livremente escrever esse texto. Tudo pelo que passei na vida, todos os livros que li, tudo que estudei diretamente na Bíblia, todas as conversas que tive com as pessoas, as perguntas que fazem sobre livre-arbítrio, a incompreensão do Leo, a indignação do meu amigo quanto a não crer nessa doutrina... tudo isso me levou a decidir escrever sobre o assunto. É lógico que eu poderia escolher sobre qualquer outro assunto, mas mesmo assim, se decidisse escrever sobre a morte de Jesus Cristo, minha escolha não teria sido livre.

         Quero terminar com mais um exemplo, ir e vir. A Constituição nos garante que podemos nos locomover para qualquer lugar. Mas nem mesmo esse direito nós exercemos com plena liberdade de ação e escolha. Se você que ir a algum lugar, primeiro está limitado a como você vai se deslocar. Minha liberdade de ir para Angra dos Reis de iate está limitada ao fato de que não tenho um iate. Olha como brincamos com as palavras – “você pode ir de iate para Angra, desde que você tenha um iate”. Agora, se você que ir a algum lugar, você só irá por algum motivo especial que o faz escolher esse local.

         Pense onde você está pretendendo passar as suas férias. Por que você está cogitando esse lugar? É por que tem praia? É por que o clima é mais ameno? É por que é longa da agitação do seu cotidiano? É por que tem muitos locais diferentes para visitação? É um local romântico para desfrutar com o cônjuge? É a opção mais barata dentro das suas limitações financeiras? É possível ir de avião, de carro, ou de navio? Você enjoa nas viagens de navio? Tem medo de viajar de avião? Você vai sozinho(a) ou com alguém? Você vai ter 30 dias de férias, ou apenas uma semana? Você prefere viajar pelo Brasil ou conhecer outros países? Você quer comprar muitas coisas nessa viagem ou quer apenas tirar fotos? Você vai sair de férias no verão ou no inverno? O lugar das suas férias tem estrutura para te receber?

         Percebeu como nossas escolhas não são tão livres assim!!!

5 comentários:

SOLA GRATIA disse...

Excelente texto. Aliás, fiquei pensando no porque eu decidi deixar de fazer o que estava fazendo para ler seu texto!

Será que foi por curiosodade? Porque sempre leio os seus textos? Porque você escreve bem e eu não poderia deixar de ler? Porque se eu não ler e você me perguntar se li, não terei jeito de te responder que não?

Puxa, será que eu então, sou escravo e não livre? Escravo de quê a final? Da amizade, da curiosidade?

Caramba, porque não escolhi ignorar o seu texto? Ufa!

Ah! Não deixe de ler o novo que postei no SOBERANA GRAÇA, se for capaz!

Marcos David Muhlpointner disse...

Já corri os olhos pelo texto do blog, mas como é longo ainda não me detive nele. Agora sou um mestrando da USP.

Mas tão logo seja possível vou lê-lo... Afinal de contas, "querer é poder"!!!!!

Abração, Marcos.

Léo disse...

Obrigado pela citação no seu texto Marcão.
Sabe, o seu texto me fez pensar o quanto o mundo tem contradições, pensando bem, Cristo não queria ser crucificado, mas bebeu o cálice de nossos pecados (esta na Bíblia isso), mas também quando erramos, é por nossa culpa, ai é o tal livre arbítrio, porém o que você disse é verdade, somos influenciados por o que esta em nossa volta e por nossas experiências...............por isso é importante pedir à Deus boas amizades ao nosso lado, mas podemos escolher as pessoas que andamos.....contraditório não?
Estou com uma frase na cabeça faz 2 semanas,ela diz assim: "O homem escolhe o seu destino no possível, porém no impossível quem age é Deus!"
Esse tema de livre arbítrio ou não dá um Doutorado em teologia, ou um livro, aliás, porque você não escreve um livro?
Um abraço e fica com Deus.

SOLA GRATIA disse...

Olá Marcão,
Eu aqui novamente.

Acabou de ser lançado no site Voltemos ao Evangelho um texto muito bom sobre o Livre-arbítrio.

Pode ser indicado para que o Léo possa ler: http://voltemosaoevangelho.com/blog/2010/08/doutrinas-da-graca-reflexoes-sobre-o-livre-arbitrio-3/

Se quiser também, pode indicar o texto que escrevi no SOBERANA GRAÇA, "a Falsidade sobre o Livre Arbítrio: http://smenga.blogspot.com/2009/12/falsidade-do-livre-arbitrio.html

Abraços,
Pr. Menga

Rute disse...

Boa tarde Marcos.

Este texto me marcou. Confesso que estou dividida: em parte eu concordo que sou livre para escolher o que quero fazer e ao mesmo tempo também creio que Deus está agindo em minha vida das mais diferentes áreas (sem tirar a liberdade, é claro) me levando a ter consciência do que está certo ou errado.

Segundo Augusto Cury, "ninguém pode decidir mudar a sua história, só você mesmo". Nesse sentido, sou livre. Mas será que tudo o que escolho realizo? Posso mudar o meu jeito de ser, ou sou da forma que nasci?

É... tenho muito que refletir.

Um abraço e que Deus continue te abençoando e usando.

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