Um amigo querido está estudando as questões sobre livre-arbítrio e salvação. Animei-me em conversar com ele, ainda que de modo virtual. Essa é a resposta que escrevi a ele sobre suas indagações. Creio que pode ser útil para outras pessoas interessadas no assunto.
Quando
tomei contato com essas doutrinas também me questionei isso. Mas veja
que todos, sem exceção, merecem o inferno. Deus não tinha – e não tem –
obrigação de salvar ninguém. O parâmetro de Deus nas Suas escolhas é Ele
mesmo. Pois sendo perfeito e bom, não existe parâmetro melhor que a
própria Trindade.
Ninguém
é capaz de se arrepender a não ser que seja convencido pelo Espírito
Santo e conduzido pelo próprio Deus ao arrependimento (Romanos 2:4).
Lembre-se que a inclinação natural da carne é inimizade contra Deus e,
portanto, por nós mesmos, sem a ação de Deus não seríamos capazes de nos
voltar para Deus.
Não
somos programados para fazer o “bem” ou o “mal”, o pecado da nossa
natureza nos inclina SEMPRE para o mal: “Não há um justo se quer,
ninguém que faça o bem”. É preciso entender que esse bem está
relacionado com a capacidade de nos voltarmos a Deus. A nós isso é
impossível, a não ser se houver a influência do Espírito Santo. Por que
precisamos participar da salvação? Em Jonas 2:9, lemos que “a salvação
pertence ao Senhor”. Ao mancebo de qualidade Jesus disse que o que era
impossível para os homens é possível para Deus. Agora, sendo Deus
perfeito, bondoso e amoroso para conosco, qual seria o problema se
fôssemos programados por Ele! Se Deus fosse um ser qualquer, aí sim
seria temerário ser programado por Ele.
Mas
não é esse tipo de Deus que os calvinistas veem na Bíblia. Certamente, o
deus que você descreveu é humano demais e não é o Deus da Bíblia. O
problema de não se reconhecer o próprio pecado é porque “o deus deste
século cegou o entendimento dos incrédulos para que não se resplandeça a
luz”. Os sentidos estão embotados não por Deus, mas pelo pecado.
Lembre-se que, sem Cristo, os homens estão “mortos nos seus delitos e
pecados”, espiritualmente mortos. Ora, “as coisas do Espírito são
discernidas espiritualmente”, como o homem natural pode entender as
coisas de Deus? A não ser que haja uma radical operação regeneradora do
coração humano, segue-se a máxima de Jesus de João 5:40, “vós não
quereis vir a mim para terdes vida”.
Estar
disposto a ser iluminado pelo Espírito Santo envolve, talvez, sermos
confrontados nas nossas convicções. Você está disposto a se reconhecer
errado, caso isso venha ocorrer? Você analisa com isenção suficiente as
duas explicações sobre salvação? Está disposto a estudar sem ideias
pré-concebidas?No final das contas a sua salvação depende de quem: de
Deus que te amou ou da escolha que você fez? A quem você agradece quando
está de joelhos aos pés do Mestre? A sua salvação é sua porque você se
esforça para mantê-la? Ou é apenas pelos méritos de Cristo que você se
mantém salvo? Aliás, é você que se mantém salvo ou é o Senhor Jesus
Cristo que preserva você salvo? Essas são perguntas que precisam ser
feitas com sinceridade ao nosso coração.
Não
faz sentido nós compararmos a justiça de Deus com os nossos padrões de
justiça. A salvação, por um lado, não tem sentido mesmo: desobedecemos a
Deus, somos pecadores na nossa natureza e endossamos o pecado com
nossas ações todos os dias; a Bíblia nos chama de “inimigos de Deus” e
mesmo assim Ele resolve pagar o preço que nós deveríamos pagar e resolve
nos amar e salvar para Si mesmo. Como isso se explica? Que sentido tem
em Deus salvar gente que o afronta todo dia?! Lembre-se que nós só O
amamos “porque Ele nos amou primeiro”. A pregação do evangelho é nossa
obrigação, mas salvar quem nos ouve é prerrogativa de Deus. É o Espírito
que “convence do pecado, da justiça e do juízo”. Lembre-se que Jesus
era seguido por uma multidão, mas Ele mesmo não confiava neles, “porque
conhecia o coração deles” (João 2:24).
Eu
não tenho capacidade de mudar o coração de uma mulher e tornar esse
coração favorável a mim. Mas Deus tem capacidade de “trocar o nosso
coração de pedra, por um coração de carne” e Ele efetivamente faz isso.
Deus não precisa Se sentir amado porque Ele é suficiente em Si mesmo.
Nesse sentido, acho que essa comparação não pode ser aplicada aqui. Ora,
Jesus pregou em inúmeras cidades e ninguém foi convertido. Veja o
exemplo da mulher que foi pega em adultério. Naquele episódio quem
precisava de salvação? A adúltera e os seus acusadores; ambos careciam
da graça divina para salvação. Mas Jesus deixou aqueles homens irem
embora e só tratou do perdão da mulher. O pecado daqueles homens foi
exposto publicamente por Jesus, eles reconheceram que estavam em pecado e
mesmo assim Jesus os deixou irem embora.
Se
eu tiver alguma participação na minha reconciliação, para que então
Jesus teve que morrer no meu lugar? Se eu, de alguma forma, participo da
minha salvação, eu não precisaria de Jesus! Eu tenho alguma de boa para
apresentar diante de Deus que me favoreça diante dEle? A motivação para
eu pregar o Evangelho é porque Deus salva e Ele só salva se as pessoas
ouvirem a Palavra de Deus. A minha motivação é porque Deus é cumpridor
da Sua Palavra e Ele garantiu que, se Sua Palavra for pregada, as
pessoas seriam salvas. A minha motivação é que Deus tem um povo e
aqueles que fazem parte desse povo precisam ouvi-lO através da nossa
pregação. Eu não sei quem vai ser salvo, mas Ele sabe. E Ele é fiel e
capaz de cumprir Suas promessas.
A
pergunta é quem pode crer? Quem pode crer em Jesus de modo salvífico?
Se tomarmos o capítulo 2 de Efésios, versos 8-9, vemos que somos salvos
pela graça, por meio da fé e isso não vem de nós. Perceba que existem
três elementos envolvidos aqui: FÉ, GRAÇA e SALVAÇÃO. E o ensino do
apóstolo é que isso não vem de nós. Não somos nós que produzimos esses
três elementos. Temos isso tudo porque isso tudo nos foi dado. Fé para
crer que minha mulher me ama é completamente diferente de crer que Jesus
Cristo é meu salvador.
Perdoe-me
pela longa resposta, mas quero muito continuar essa conversa com você. É
muito bom conversar com quem pensa, com quem estuda. Um grande abraço,
Marcos.
Reflexões sobre música, ciência e teologia por um biólogo-teólogo-músico. Pelo menos da Biologia tenho o diploma.
sábado, 14 de dezembro de 2013
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