Esse é o texto do sermão que preguei na Igreja Batista da Vila Gerte (São Caetano), dia 24 de junho de 2012.
A
palavra de Deus não esconde as mazelas dos seus personagens humanos. Quantas
vezes queremos esconder nossos erros e fracassos, para que as pessoas nos
aceitem! O cantor Frejat mostrou essa preocupação numa letra de música:
Procuro um amor, que seja bom pra mim,
Vou procurar, eu vou até o fim,
E eu vou tratá-la bem, pra que ela não
tenha medo,
Quando começar a conhecer os meus
segredos.
A Bíblia deixa muito claro, inclusive
de seus principais personagens, quais foram seus erros e fracassos e não os
esconde de ninguém. Apenas como exemplo podemos citar o caso do rei Davi, mesmo
sendo um homem segundo o coração de Deus (Atos 13:22), teve alguns de seus
pecados registrados no Antigo Testamento. Um deles foi querer fazer o
recenseamento do povo (1 Crônicas 21) contra a promessa de Deus de fazer o povo
de Israel uma grande nação. Por causa desse pecado de Davi, 70 mil homens
morreram de peste. O outro pecado, famoso na vida de Davi, é seu adultério com
Bate-Seba (2 Samuel 11).
O povo de Israel, na Teologia,
representa o que é, hoje, a Igreja de Cristo. Guardadas as devidas proporções,
podemos aplicar várias passagens do povo de Deus do Antigo Testamento para a
nossa vida. É bem verdade que precisamos lembrar que o Antigo Testamento é uma
prefiguração do Jesus Cristo e não da nossa vida diretamente. Sendo assim, eu
gostaria de convidá-los a pensar algumas coisas em relação à nossa vida.
O apóstolo Tiago se expressou muito bem quando, na sua
carta, explicou a ação da língua na vida das pessoas (Tiago 3:1-12). Trata-se
de um órgão muito pequeno, mas com um poder devastador de quem não sabe usá-la.
O aposto diz que a língua pode ser inflamada pelo inferno (v. 6), o que
demonstra a facilidade com que pecamos no uso da língua. Numa de suas conversas
com Seus discípulos, o Mestre disse que a boca fala com o que está presente no
coração (Lucas 6:45). Na Bíblia, o coração é mais do que um órgão que bombeia o
sangue. Em sentido figurado, o coração é a sede do intelecto (Gên. 6:5), dos
sentimentos (1 Sam. 1:8) e da vontade (Salmo 119:2). Portanto, como ensinou o Mestre em outra
oportunidade, “O homem bom tira boas coisas do seu
bom tesouro, e o homem mau do mau tesouro tira coisas más.” (Mateus 12:35).
Precisamos tomar
cuidado com o que falamos, com quem falamos e como
falamos. Davi, no Salmo 19, nos conclama a que nossas palavras sejam agradáveis
diante do Senhor. Mas o falar do salmista, vem acompanhado com a meditação do
coração, o que nos mostra o estreito vínculo da boca com o coração (v. 14).
Salomão, em seus Provérbios, também nos chama a atenção para uma boa qualidade
de vida, a partir do bom uso da nossa língua, “O que guarda a boca e a língua
guarda das angústias a sua alma.” (Provérbios 21:23). E mais uma vez,
recorremos ao apóstolo Tiago, quando ele nos ensina que falar demais está
associado à ira que essa tagarelice pode causar, “Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto
para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar.” (Tiago 1:19).
Para nossa lembrança,
murmuração significa falatório depreciativo, detração,
maledicência, calúnia e mexerico. Mas quais eram os motivos que o
povo de Deus tinha para tratá-lO dessa maneira? A Bíblia faz separação entre
uma reclamação justa e entre uma reclamação injusta, ou seja, um murmúrio. Em
Lucas 18, Jesus conta uma parábola de uma viúva que importunava um juiz
malvado. De tanto importunar o juiz, a viúva conseguiu que o juiz julgasse a
sua causa (v. 5).
No Antigo Testamento
vemos, pelo menos, 10 situações em que o povo de Israel murmurou contra o
Senhor, isto é, reclamou sem uma justa causa.
1. Êx.
14.11 — Quando perseguidos pelos egípcios junto ao mar vermelho lamentaram
a sua morte.
2. Êx.
15.23 — As águas eram amargas e disseram: que havemos de beber? Moisés
lançou um pau nas águas e ficaram doces.
3. Êx.
16.2 — Faltou o pão e lamentaram as panelas da carne. Deus enviou maná de
manhã e carne à tarde.
4. Êx.
17.3 — Não havia água. Disseram: por que morreremos à sede? A rocha
deitou água.
5. Êx.
32.1 — Moisés demorava-se e pediram deuses que os guiassem. Arão
deu-lhes um bezerro de ouro. Irou-se o Senhor, (9–11).
6. Nm.
11.1 — Queixaram-se do maná no deserto. Veio fogo do Senhor e consumiu
alguns no arraial.
7. Nm.
12.2 — Miriam e Arão também querem a liderança. O Senhor irou-se e Miriam ficou
leprosa, (9,10)
8. Nm.
14.2 — Revelam temor dos gigantes da terra e murmuram. Deus disse
que não entrariam na terra prometida, (23).
9. Nm.
16. 3 — A rebelião de Coré contra a liderança de Moisés e Arão. A terra
engoliu os rebeldes. E fogo do Senhor consumiu os 250; (33,35)
10. Nm.
16.41– Depois disseram: vós matastes o povo do Senhor. Deus indignou-se e
enviou uma praga morrendo mais 14.600.
Vamos ver a ocorrência do bezerro de ouro,
relatada em Êxodo 32.
O
povo estava cansado de esperar sem ter uma resposta, por isso começou a
murmuração (v. 1). Daí, pediram que Arão fizesse um bezerro de ouro, usaram
suas riquezas para a fundição e fizeram para si um deus imaginário (v. 2-4).
Feito isso, o sacerdote Arão declarou que no dia seguinte seria um dia de festa
para o Senhor (v. 5). Quando amanheceu, o povo ofereceu sacrifícios, comeu e
bebeu e se divertiu (v. 6). E é exatamente aqui o grande problema da murmuração:
atribuir à criação o que é obra
exclusiva de Deus.
Deus
é muito claro quanto ao zelo que Ele tem com Seu nome e com Sua glória, “Eu sou o SENHOR; este é o meu nome; a minha
glória, pois, a outrem não darei, nem o meu louvor, às imagens de escultura.”
(Isaías 42:8). Ele agiu dessa forma com Satanás (Ezequiel 28:13-19); agiu dessa
forma com Nabucodonosor (Daniel 4:33).
O
caso de Nabucodonosor é emblemático quanto a não atribuir a Deus o que Lhe é
devido. Ele se inflou no seu orgulho, na grandeza do seu reino, nas riquezas
que amealhou, ele cresceu e confiou na força do seu poder. E, por causa desse
poder todo, atribuiu a si mesmo a sua grandiosidade (Daniel 4:30). E no mesmo
instante Deus mostrou-lhe quem realmente manda (v. 31-33). Por causa de sua
arrogância, Nabucodonosor foi contado com os animais do campo.
No
episódio do bezerro de ouro, o povo reclamou contra o Senhor, atribuiu a um
animal irracional o que era de Deus e a ira do Senhor Se acendeu contra Seu
povo. E como Deus impetrou a Sua justiça? A justiça de Deus foi vindicada pelos
levitas. A murmuração foi combatida pelos levitas, os responsáveis pelo louvor
a Deus. É assim que Deus trata a reclamação do Seu povo. Ele é intolerante com
esse comportamento. E o louvor é exatamente o oposto disso. Louvar a Deus
significa que não estamos pensando nas derrotas, nas dificuldades, pois
atribuímos a Deus as nossas bênçãos.
Quando
louvamos a Deus nossa boca se enche de alegria e gratidão pela obra de Deus na
nossa vida. Quando exaltamos o “Deus da nossa salvação”, reconhecemos a nossa
pequenez e, ao mesmo tempo, reconhecemos a grandeza de Deus. O louvor a Deus
nos liberta (Paulo e Silas – Atos 16:25-26); Saul era liberto de um espírito
mau quando Davi tocava sua harpa (1 Samuel 16:23).